Santo Agostinho, em seu livro clássico, “A Cidade de Deus”, ao organizar a justificativa sobre o sofrimento dos justos, fala sobre o dever humano de controlar e combater o mal, não se omitindo ou se associando aos ímpios por medo de se expor publicamente, por desejo de reputação, aprovação ou outros ganhos sociais. Ele chama a atenção para o fato dessa associação transformar o ímpio e o justo na mesma matéria humana, pessoas que por amor aos bens temporais associam-se com aqueles que abominam. Agostinho afirma que Deus ama em liberdade e o exercício do livre arbítrio pela manifestação dos justos é a forma mais efetiva de se combater o mal.
De certa forma, na mesma direção, mas naturalmente guardando as devidas proporções, segue a argumentação da filósofa Hannah Arendt no livro Eichmann em Jerusalém. Ao ser acusado de crime contra a humanidade, o gênio da logística alemã Adolf Eichmann, sem o qual a máquina mortífera de Hitler não teria conseguido a escala que alcançou, alega ser apenas um funcionário cumprindo ordens de Estado em uma organização burocrática. A argumentação de Arendt mostra que nunca se pode separar as ordens da burocracia da aquiescência individual. Há sempre uma pessoa que pode dizer sim ou não. Isso nos leva à questão da construção da reputação pessoal: se a organização em que você se encontra é liderada por pessoas cujos valores são discutíveis, faz negócios e atinge seus resultados por meio de ações cuja ética é contestável, resta a pergunta: que reputação pessoal você pretende construir ai? Lembre-se que, muito mais do que as suas palavras, as suas escolhas falam sobre você e o quanto você está disposto a ceder em seus valores e crenças pessoais por ambição. Não que a ambição de construir reputação por meio do trabalho seja ilegítima, muito pelo contrário. Mas a sua vida profissional vai ficar marcada por essa experiência e pela sua conivência com os valores e práticas desta organização. Você será um ex-organização X. Ou seja, você será reconhecido como um deles.
Reflexão nos ajuda a compreender que essa decisão pode parecer trivial, mas já atormenta a humanidade há muito tempo. Atualmente, o mundo corporativo é marcado por padrões de comportamento ambíguos que geram reputações duvidosas. Crises econômicas revelam na sua origem uma crise moral. Porém, vivemos em tempos em que as sociedades estão demandando mais informação e transparência. O mundo do trabalho esta sedento por expressões legítimas de ações baseadas em valores que possam construir um ambiente produtivo onde as pessoas possam encontrar espaço para trabalhar em seu nível de competência máxima. Atitudes desprovidas de sentido e orientação moral geram conflitos pessoais e uma atmosfera de grande descrédito quanto à capacidade de criarmos ambientes de trabalho que realmente possam produzir resultados superiores baseados em valores éticos sustentáveis.
O bem mais sustentável que você pode construir em sua vida é a sua reputação pessoal. Pense nisso.
Marco Tulio Zanini
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